segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Lei da Felicidade


Deveria existir uma lei que proibisse a tristeza, abandono e exploração de crianças.
Serafina não entendia a razão que levou seus pais colocá-la naquela lata de lixo.
- Será que eles acharam que eu era feia? 
- Se um dia eu tivesse um reino, com certeza isso não aconteceria.
Mas, antes que completasse seus pensamentos, ela levou um safanão no pescoço.
- Avia logo este trabalho menina! Tá querendo cair no couro outra vez é?
Lágrimas escorrem pelo rosto de Serafina.  Até quando ela teria que viver nessas condições de vida? Será que nunca ia poder ser uma criança normal?
Infelizmente, não era só ela que passava por isso. A maioria das crianças deste reino sofriam maus tratos e exploração. Ouviu- se dizer que nas bandas mais distantes havia também escravidão e abusos sexuais. Mas ninguém parecia se importar. A parte mais rica do reino só ligava pra festas, dinheiro e luxos. Eles dizem que não concordam, mas, nada fazem para mudar esta cruel realidade.  Num dia sombrio e nublado, Serafina acordou sentindo que algo ruim estava prestes a acontecer. Não sabia explicar exatamente, mas, a sensação não era boa.  Levantou-se da cama e foi fazer o café para seu pai (que na verdade não era pai de verdade, ele jura tê-la encontrado numa lata de lixo).
Enquanto fazia as suas obrigações seu pai entrou na cozinha, fazendo com que ela sentisse um arrepio na espinha.
- Você está crescendo e se tornando uma bela moça. Logo vai poder casar comigo e me servir como se deve.  É o mínimo que tu podes fazer para retribuir tudo o que eu fiz pela sua vida. Sem mim, estarias morta.
- Eu sei que te devo a vida, mas, não preciso me casar com você para lhe pagar. Já lhe retribuo com o meu trabalho e cuidando de você. Isso é mais que suficiente não acha?
Recebeu um soco no rosto, mas foi tão forte que sentiu o sangue escorrer.  Chorando ela respondeu:
- O café está pronto. Vou trabalhar.
Antes que pudesse dar dois passos, Malvino a pegou pelo braço e jogou-a no chão. Começou a lhe tocar de forma indevida e num momento de descuido, ela deu uma mordida nele e saiu correndo. De longe, ela ouvia os berros:
- Isso não vai ficar assim!  Quando você voltar vou te ensinar a respeitar os mais velhos.
 Serafina saiu chorando rios de lágrimas. No caminho, sentou-se à beira de um riacho e lavou o seu rosto.
- Será que um dia isso vai ter fim? Não volto mais para aquela casa. Cansei de viver desse jeito. Vou procurar a minha felicidade.
Pegou a sua sacola e começou a cantar, pois segundo ela isso ajudava a espantar a tristeza. Só que ela não esperava que acontecesse algo que mudasse seu destino para sempre. Ela cantou tanto que se descuidou e caiu num buraco profundo.
Mas a queda demorou tanto que Serafina acabou dormindo.  Quando ela acordou, se viu deitada numa cama enorme.  Olhou pros lados e percebeu que estava num enorme castelo. Pouco depois, uma mulher entrou no seu quarto sorrindo e lhe perguntou:
- Bom dia princesa Serafina. Como dormiu? O café está servido. Troque logo se roupa porque seu pai está te esperando. Você sabe muito bem que ele não gosta quando você se atrasa para as refeições.
Ela não entendeu nada. Porque aquela simpática senhora estava lhe chamando de princesa?
Antes que a senhora saísse, ela a chamou:
- O que está acontecendo? Eu não deveria está aqui...
Antes que a criada respondesse, uma borboleta enorme entrou pela janela e deixando todo o quarto brilhante com a sua luz. Logo ela pousou na cabeceira da cama e se transformou numa linda mulher.
A criada sorriu e sai do quarto, pois, sabia que através da borboleta ela encontraria as respostas que precisava.
- Quem é você? O que está acontecendo? Estou ficando assustada com tudo isso.
Então, a linda moça-borboleta piscou os olhos três vezes e logo ela começou a se lembrar.
- Ah sim, agora eu sei bem onde estou e quem sou. Que susto! Mas eu não entendo, porque estou com essas roupas horríveis?
Piscou os olhos mais uma vez e uma imagem se formou no ar. Tudo o que ela vivera na parte pobre do reino começou a aparecer. Ela se encolheu na cama quando a imagem de Malvino apareceu.
- Pare com isso! Qual a necessidade de me fazer passar por essa situação constrangedora. Eu deveria mandar meu pai extinguir do reino todos os seres iguais a você.
Bom, você pode até fazer isso, mas, antes deixe eu te mostrar o propósito de tudo isso.
Outras imagens começaram a se formar. Crianças sofrendo, sendo exploradas, comendo lixo, sendo molestadas começaram a aparecer. Dava pra ver as lágrimas escorrendo pelos rostos, o medo constante que as assolava e até viu uma delas sendo tocada de forma indevida. Mas uma vez ela começa a chorar.
- Por favor, pare.
As imagens somem e a moça - borboleta começa a falar:
- Você sempre viveu neste castelo, nunca passou fome e é uma menina muito amada por sua família. Porém com tudo isso, se tornou uma criança arrogante e mimada que não se importa com os outros. Maltrata os empregados e vira a cara para os pobres. Vive dizendo que não suporta ir naquelas bandas do reino.  Foi preciso passar por tudo isso para que você acordasse e soubesse da existência do sofrimento de crianças da sua idade.
Levantou-se da cama e disse:
- Obrigada, agora eu entendo. Vou mudar minhas atitudes. Agora mesmo vou conversar com o meu pai. Ele é o rei e as crianças não devem mais sofrer. Uma lei precisa ser criada. A felicidade precisa ser a ordem principal para as crianças.
Correu para abraçar aquele ser que lhe abrira os olhos, mas, antes que ela o fizesse a borboletinha saiu pela janela e tudo voltou a ser como antes. Serafina se apressou e desceu para o café. Conversou com seu pai e pediu para que ele a levasse na parte pobre do reino. Quando regressaram, disse que aquilo precisava acabar e ela contou sobre a ideia da criação de uma lei: A lei da felicidade. Ele concordou e pediu que reunisse todos os seus súditos para anunciar a sanção da seguinte lei:
“De agora em diante, em todas as partes do meu reino está proibido o abandono, exploração e maus tratos. Nenhuma criança poderá ser submetida a este tipo de coisa. Criarei também uma escola para que todas, sem exceção possam estudar. Fiscais estão sendo espalhados por todos os lados para garantir que a lei seja cumprida. Qualquer um que infringir estará sujeito a pena de morte.”
Todos comemoraram e as coisas finalmente mudaram. Agora as crianças estavam felizes e iam à escola, podiam brincar cantar e dançar. Aquele passado triste foi apagado e agora elas estavam escrevendo uma nova história, tendo esperança de que um dia seus sonhos seriam realizados.

Essa lei ficou conhecida como a “Lei da Felicidade” e com o passar dos anos, outros reinos foram aderindo até que todo o mundo entendesse que os abusos precisavam acabar. E de fato acabaram.